24.9.07

Amor e amnésia

Muito muito interessante história sobre Clive Wearing, um músico inglês que, há 22 anos, teve uma doença cerebral que o fez perder a memória. Ele é considerado o pior caso de amnésia já registrado.


 Sua memória tem a duração de poucos segundos, ele não se lembra de nada do seu passado, seus conhecimentos gerais foram largamente afetados e sua memória implícita (útil na localização de objetos e lugares) só é suficiente pra que ele não se perca dentro de sua própria casa.

O interessante são as duas coisas que permaneceram em sua memória: como tocar piano, ler música e reger, e que ele amava a esposa.

A esposa dele (Deborah) escreveu um livro de memórias ("Forever today: a memoir of love and amnesia"). Vou (tentar) traduzir aqui um pedaçinho do artigo sobre isso. Mas se você tem tempo, paciência e lê inglês, eu realmente recomendo a leitura do artigo original.

"Quando eu perguntei à Debora se Clive sabia sobre sua biografia, ela me disse que tinha mostrado o livro pra ele duas vezes, mas que ele tinha esquecido imediatamente. (...) Eu pedi a ela pra mostrar o livro pra ele de novo. "Você escreveu um livro!" Ele exclamou, estarrecido. "Que bom! Parabéns!". Ele examinou a capa. "Você escreveu tudo sozinha? Meu deus!" Excitado, ele pulou de alegria. Deborah mostrou a ele a dedicatória:"Para o meu Clive." "Dedicado a mim? Ele a abraçou. A cena foi repetida diversas vezes em apenas alguns minutos, com quase exatamente a mesma surpresa, as mesmas expressões de alegria a cada vez."

"When I asked Deborah whether Clive knew about her memoir, she told me that she had shown it to him twice before, but that he had instantly forgotten. I (...) asked Deborah to show it to him again. “You’ve written a book!” he cried, astonished. “Well done! Congratulations!” He peered at the cover. “All by you? Good heavens!” Excited, he jumped for joy. Deborah showed him the dedication page: “For my Clive.” “Dedicated to me?” He hugged her. This scene was repeated several times within a few minutes, with almost exactly the same astonishment, the same expressions of delight and joy each time."

10.9.07



Frankfurt anda horrível esses dias. Tem mais de uma semana que a temperatura não vai acima de 15° C e ver um pouquinho de céu azul só em foto mesmo.

Hoje está ventando muito e o dia está tão fechado que eu estou trabalhando com a luz da sala acesa, mesmo tendo, aqui no prédio novo, 50% de parede com janela.

Ah, pois é, meu instituto se mudou. Mesmo campus, 200 metros de distância do prédio antigo, mas agora em um prédio dedicado só pra ele. É bonito, vermelho, ou pelo menos essa é minha opinião. Um monte de gente aqui acha o prédio feio, talvez seja porque eles nunca estudaram no Fundão ou na UERJ.

O prédio é bem colorido para os padrões alemães, o que é bom. Cada andar do prédio tem uma cor diferente. O meu é verde, e é bonito. Não dentro das salas, dentro das salas é branco mesmo.

Minha sala fica numa esquina do prédio, 2° andar se você não contar o térreo. É uma sala enorme, que eu divido com mais 3 pessoas. Um dos meninos só vem uma vez a cada 15 dias, então na maior parte do tempo somos mesmo apenas 3.

E tem até carpete. Agora que está novinho é uma maravilha. Eu passo o dia descalça ou de meia. Na maioria dos dias de meia, por causa do frio. Não sei como vai ficar a longo prazo, entretanto. Carpete é um negócio difícil de limpar, e não muito justificável no caso do nosso prédio.

A sala é tão grande que a gente até comprou um sofá no Ebay semana passada, de 3 lugares. bom pra tirar uma soneca depois do almoço. Chega semana que vem. E só bate sol na sala de manhã, o que seria ótimo, caso fizesse sol em Frankfurt.

Minha mãe me ligou ontem, voltando de Lumiar: "Ai, minha filha, Lumiar estava maravilhoso, eu nunca vi o rio tão baixo, transparente. Estava fazendo um sol danado lá. Eu peguei tanto sol e tomei tanto banho que quase fiquei doente."

Alguém precisa avisar ao planeta que devia ser verão na Alemanha, não no Brasil. Ou alguém precisa me lembrar que eu nasci pra morar em um lugar com clima um pouco mais mediterrâneo.

Aí em baixo: Lumiar em dia de sol. Lá em cima: prédio novo também em dia de sol, só pra me contrariar.

5.9.07

Ouvido (quase!) absoluto

A revista americana 'Proceedings of the national academy of science', que publica artigos científicos em diversas áreas, tem um artigo esse mês sobre pessoas com ouvido absoluto, na sua seção sobre neurociências.

Uma pessoa que tenha ouvido absoluto é capaz de identificar uma nota musical sem a necessidade de uma outra nota ser dada como base de referência. A nota mais comumente usada como referência é o lá (A). Numa orquestra, por exemplo, os instrumentos são afinados de acordo com um A, normalmente tocado pelo primeiro violinista.

Uma analogia muito boa (roubada do artigo) pode ser feita com nossa habilidade de identificar cores. Precisar de uma nota de referência (como o lá) pra saber uma segunda nota é, por exemplo, como precisar primeiro ver um objeto vermelho (e ter a informação de que ele é vermelho) antes de identificar um segundo objeto como azul.

Ser capaz de reconhecer cores absolutamente é algo trivial, mas são poucas as pessoas que conseguem fazer o mesmo com notas musicais.

Os cientistas fizeram testes de reconhecimento de notas musicais com mais de duas mil pessoas, via internet. Essas pessoas foram recrutadas em escolas de música ou em sites especializados em música na internet, e mais ou menos 80% das pessoas afirmaram ter estudado música por 6 anos ou mais. Dessas pessoas, 44% foram avaliadas como tendo ouvido absoluto.

A primeira conclusão é que pessoas com ouvido absoluto acham mais freqüentemente que uma nota é mais aguda do que ela realmente é (dizendo, por exemplo, que um si é um dó) do que o oposto. E que isso piora com a idade, ou seja, pessoas mais velhas cometem esse erro mais freqüentemente. Pessoas que não têm ouvido absoluto tendem a errar as notas aleatoriamente.

Outro resultado interessante é que pessoas com ouvido absoluto erram muito a identificação de notas próximas do A, como o sol sustenido (G#). Só metade das pessoas acertou a nota quando um G# foi tocado, e metade dos que erraram confundirram o G# com o A.

A expicação para isso é a seguinte: por conta do A ser usado como nota de afinação, e por conta de várias freqüencias diferentes acabarem sendo usadas pra afinar o A (além da tradicional 440hz), músicos acabam se acostumando a incluir o G# (e também o A#) numa larga categoria 'A', e isso acaba os confundindo.

O mesmo efeito ocorre com línguas ou cores. Se a língua que você fala só tem dois sons pra uma vogal, vai ser difícil pra você identificar cinco diferentes nuances dessa vogal, quando você está aprendendo uma língua estrangeira. Do mesmo modo, esquimós são capazes de reconhecer sei lá quantos mil tons de branco, enquanto outras pessoas vão reconhecer apenas dois ou três.

O engraçado é que erros de identificação do A# não são nem de longe tão freqüentes quanto os erros com G#. Uma soma dos dois resultados acima explicam isso. O fato do A# estar muito próximo do A é "cancelado" pelo fato de que as pessoas tendem a errar as notas pro agudo, não pro grave. Com isso, as pessoas acabam acertando o A# muito mais do que o G#.

Essa distorção relacionada com o G# não aconteceu quando as pessoas, ao invés de ouvirem uma nota pura, ouviram uma nota tocada no piano, onde freqüências secundárias estão incluídas. A explicação pra isso é que pianos estão quase sempre afinados com o A a uma freqüência de 440hz, de modo que as pessoas não se acostumaram a um A com uma freqüência imprecisa, como no caso da nota pura.

Por último, os cientistas acreditam que ter ouvido absoluto é algo que requer a soma de uma predisposição genética com o estudo de música quando criança. Eles também acham que essa capacidade é controlada por apenas um ou poucos genes, porque as pessoas estão basicamente divididas em dois grupos: aqueles que não têm ouvido absoluto, e cujos resultados no teste foram basicamente aleatórios, e aqueles que têm ouvido absoluto, cujos resultados foram consistentemente bons. Apenas muito poucas pessoas tem algo como 'meio' ouvido absoluto, ou seja, acertam mais notas do que a média mas não o suficiente para serem consideradas como tendo ouvido absoluto.

Eu sempre tive inveja de quem tem ouvido absoluto :-).



Obs.: Espero não ter matado ninguém de tédio...


Eu encontrei esse artigo via Slashdot

2.9.07

Documenta 12: Ines Doujak

Ines Doujak é uma artista plástica austríaca, que vive em Viena. O trabalho dela na documenta era um grande canteiro com sementes, tratando sobre biopirataria.



Os pacotes de semente contêm, no verso, denúncias sobre práticas de comércio abusivas, exploração irresponsável de recursos naturais e registros ilegais de patentes relacionadas com sementes e plantas.


Havia vários pacotes sobre produtos brasileiros: cupuaçu, kaxinaua (seja lá o que isso for), jaborandi, açaí, pau-brasil, copaíba e até rapadura.


Na frente, os pacotes mostram fotomontagens relacionadas com o tema tratado no verso.


Outras fotos:

28.8.07

Documenta 12: Iole de Freitas

O maior destaque brasileiro na Documenta é o trabalho da Iole de Freitas, artista mineira que mora no Rio, razoavelmente conhecida internacionalmente. Os trabalhos eram bem parecidos com os que ela apresentou em uma exposição individual no CCBB em 2005. 

Eu particularmente acho essa trabalho dela muito bonito, uma incrível mistura de 'equilíbrio, leveza e translucidez'. O link é para uma entrevista com ela feita pelo site da Deutsche Welle, que se auto-define como a "empresa internacional de comunicação da Alemanha".

O trabalho na Documenta ficou especialmente bonito porque também está exposto na fachada do museu, quase como uma continuação pela parede do trabalho do lado de dentro.

O trabalho ocupava uma sala bem grande onde estavam também pequenos trabalhos de outros 2 ou 3 artistas, inclusive esse (a foto está bem ruim!) da Mira Schendel (1919-1988), artista brasileira (mas nascida na Suíça) que eu gosto muito. Tinham alguns outros trabalhos dela espalhados pelas várias galerias da Documenta.


Abaixo algumas fotos (também não muito boas, fora a que eu 'roubei' na internet) do trabalho da Iole em Kassel.


27.8.07

Documenta 12: Romuald Hazoumé

Romuald Hazoumé é um artista plástico de Benim, oeste da África.



A última máscara é a minha favorita. 

Fim de semana

A Documenta é uma das mais importantes exposições de arte contemporânea do mundo. Ela acontece de 5 em 5 anos, na cidade de Kassel, aqui na Alemanha.


Dois dias é (quase) suficiente pra ver tudo (mas não para entender/absorver/digerir). E não é recomendável ir pra balada na noite anterior da viagem :-).

Grüne See


O lugar com a natureza mais bonita nos arredores de Frankfurt. 

Me disseram que é uma pedreira que foi inundada acidentalmente. E que é uma reserva, e portanto é proibido nadar lá. Eu fingi que não ouvi a última parte :-).

16.8.07

você está vivendo em uma simulação computacional?

"Esse artigo argumenta que pelo menos uma das seguintes proposições é verdadeira: (1) a espécie humana muito provavelmente será extinta antes de chegar a um estágio "pós-humano"; (2) é extremamente improvável que qualquer civilização pós-humana faça simulações da sua história evolucionária (ou variações disso); (3) nós quase com certeza vivemos em uma simulação computacional. Segue que a crença de que existe uma chance razoável de um dia nós nos tornarmos pós-humanos que fazem simulações sobre nossos ancestrais é falsa, a menos que nós estejamos atualmente vivendo em uma simulação. Também são discutidas algumas outras conseqüências desses resultados."


"This paper argues that at least one of the following propositions is true: (1) the human species is very likely to go extinct before reaching a “posthuman” stage; (2) any posthuman civilization is extremely unlikely to run a significant number of simulations of their evolutionary history (or variations thereof); (3) we are almost certainly living in a computer simulation. It follows that the belief that there is a significant chance that we will one day become posthumans who run ancestor-simulations is false, unless we are currently living in a simulation. A number of other consequences of this result are also discussed."


Esse é o resumo de um artigo que o filósofo Nick Bostrom, do Departamento de Filosofia da Universidade de Oxford, na Inglaterra, publicou há um tempo. Eu achei esse artigo ontem via esse site, onde eu assino o canal de filosofia da ciência.

A idéia de o universo onde a gente vive não ser real não é nova. Em O Mundo de Sofia, por exemplo, a personagem principal do livro um dia descobre que é a personagem principal de um livro. O filme Matrix também aborda o tema de pessoas vivendo em uma realidade virtual. 

A diferença principal dessa idéia para o filme, entretanto, é que nós não seríamos seres reais vivendo em uma realidade virtual, mas seres virtuais vivendo em uma realidade virtual. E a diferença principal entre ser um personagem em um livro ou um ser virtual em uma realidade virtual é a noção de que um ser virtual de fato pode ter uma consciência.

A idéia de um ser virtual que tem consciência, do ponto de vista teórico, é perfeitamente plausível. Nosso cérebro não é nada mais que um super-computador. E a idéia de que a gente um dia vai ter poder computacional para fazer essas simulações também não é absurda, dada a rapidez com que computadores têm evoluído. 

O problema mesmo é saber se o ser humano um dia vai ter conhecimento suficiente pra fazer simulações da nossa história evolucionária. Primeiro, porque a arquitetura do cérebro é muito diferente da arquitetura dos computadores que a gente produz, não sendo isso relacionado com quão rápidos os computadores são. O cérebro é milhões de vezes pior que um computador comum para fazer contas, por exemplo, mas absurdamente melhor em reconhecer pessoas. Segundo, é impossível provar que um programa de computador funciona perfeitamente, independente de quantos testes você faça.

Isso significa que, mesmo se nós formos de fato seres virtuais vivendo em um mundo virtual, a probabilidade de nós sermos exatamente como os seres ancestrais da raça que nos programou é bem pequena, se não inexistente.

E. para os pós-humanos que teriam feito o programa, as simulações frustariam tanto quanto a um visitante à Biblioteca de Babel de Borges procurando pela história da sua vida. Há uma probabilidade de que uma simulação seja exatamente como seus ancestrais, mas há uma outra simulação, onde apenas uma coisa ínfima foi modificada, que também pode perfeitamente ser exatamente como seus ancestrais. 

E para nós, acredito ser bastante indiferente o fato de vivermos ou não em uma realidade virtual, de existirmos apenas na memória de computadores ou não. A menos que alguém acidentalmente tropeçe no fio que estava ligando o computador na tomada :-).

coisas bonitas, simples e úteis

Acho que descobri o que quero fazer da vida.